O ensinamento sobre o “Coração” é o assunto desta Encíclica, para mim a mais bela e mais profunda do Papa Francisco. Por que falar do coração? Porque ele revela o Amor sensível humano, a caridade, que é o amor voltado para a verdade e o amor inflamado pelas emoções. Foi pela Emoção que Deus quis vir até nós, assim ela, seu Coração, é o caminho pelo qual o Amor de Deus se tornou sensível para nós.
É preciso refundar a Antropologia humana sobre o coração e não somente sobre ideologias abstratas, mesmo as teológicas. O homem é algo ao mesmo tempo espiritual e carnal, e o coração é o centro no homem que sintetiza tudo. Isto dá ao coração uma característica que o torna o centro do ser humano. São Boaventura vai dizer: “Devemos fazer perguntas para o Fogo e não para a luz”. O fogo é o Coração de Jesus, a luz é a inteligência. E o santo continua: “A fé está dentro do intelecto para provocar o sentimento”. A fé é intelectual para avivar a carne.
Por que falar do Coração de Jesus? Porque nós somos cristãos. A Encíclica faz uma bela explicação de como o Amor divino se exprime nas emoções humano-divinas de Jesus: o seu olhar, os seus braços, as suas mãos que tocam os sofredores: tudo em Jesus nos revela como é o coração de Deus.
Falar do coração é falar da piedade popular. O povo simples sabe mais das coisas de Deus que muitos discursos acadêmicos teológicos muito bem estruturados. As ladainhas, as imagens sagradas, as procissões, a Via-Sacra e os rosários garantem ao Povo contemplar um Deus encarnado na sua vida real. Muito mais que velhos livros de alguns teólogos que não gostam do Povo simples. A piedade popular conseguiu sempre colocar os Santos Evangelhos em linguagem direta.
A devoção ao Sagrado Coração é uma devoção equilibrada que nos permite avançar de modo seguro no caminho para Deus. É preciso entender que o Coração é a carne que participa da salvação. Isto nos lança fortemente numa relação pessoal com Jesus. Aqui passamos bem longe da new age, dessas espiritualidades água com açúcar, que falam de energias e outras ilusões.
A Igreja não é apenas humanitária num sentido raso, ela é o Coração de Jesus que transborda em todos os seus membros agindo sobrenaturalmente. Esta devoção nos obtém uma vigilância e uma desconfiança contra toda falsa mística que anula o carnal. É uma devoção incarnada e o Coração de Jesus é a porta de entrada para uma mística autêntica e equilibrada.
O Coração de Jesus está no centro da história da salvação. A Encíclica está cheia de referências da Bíblia sobre este Coração. Ela é uma escola onde o Papa nos dá uma verdadeira aula de história da espiritualidade. O Papa chama atenção para os santos franceses: Bernardo, Margarida Maria, Teresa de Lisieux, Charles de Foucauld: todos eles nos ensinam maravilhas deste Coração divino-humano.
Este Coração é regulador, ou seja, é um princípio que dirige toda espiritualidade cristã. As noções de culpa, sacrifício e reparação têm sua importância somente se forem iluminadas pela imensidão do Coração de Jesus. Caso contrário elas se tornam fontes de doenças mentais. É o Coração de Jesus que é grande, muito maior que os pecados e misérias do mundo.
Estar ao pé da Cruz, contemplar o Coração de Jesus, nos consola e ao mesmo tempo nos dá vontade de consolar os outros. O caminho da santidade é o caminho do Amor dentro de nós, porque a contemplação do Coração de Jesus nos permite passar este Amor de Deus, que começa a habitar em nós e transborda de nós para os outros. A maravilha é que o Coração de Jesus vem habitar em nós. Nós trazemos o Coração de Jesus que resplandece em nós para irmos ao encontro dos irmãos que precisam.
Frei Alonso Malaquias, O. Carm.
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