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Artigo por Frei Juliano: Os missionários, destinatários de um grande tesouro espiritual

Santa Teresa escrevia para alguns sacerdotes. Destacam-se entre esses os dois Missionários Padre Roulland e Padre Bellière, esse último responsável por onze cartas da Santa que revelam muito da sua experiência de fé, principalmente quando se trata do final de sua vida.O primeiro irmão espiritual de Santa Teresinha foi o seminarista Maurício Bellière (Maurice Bellière) confiado às orações de Teresa pela Madre Inês de Jesus em 17 de outubro de 1895. Maurício Bellière pertencia à Congregação dos Padres Brancos e ainda como seminarista entrou em contato com o Carmelo de Lisieux pedindo que alguma das irmãs o acompanhasse com orações, principalmente, em vista da missão como sacerdote.

Padre Bellière trabalhou como missionário na África e realizou o desejo que Teresa tinha de contribuir com uma missão apostólica. Foram apenas onze cartas, mas, suficiente para criar entre os dois um profundo laço de amizade e confiança.

Nos últimos meses da vida de Teresa, as cartas escritas ao Padre Bellière revelam profundamente o que aquele momento significava para ela. Foi com muita tristeza que ele recebeu a notícia da sua grave doença com a carta enviada em 13 de julho de 1897, Teresa tenta consolar seu irmão dizendo: “serei por toda eternidade a sua irmãzinha”.

Forçado a deixar a missão por motivos de saúde, Padre Bellière morreu na França com apenas 33 anos de idade. Nas cartas endereçadas a ele, encontramos uma Teresa extremamente sensível aos problemas alheios, uma amiga fiel disposta a escutar e sustentar nos momentos difíceis.

O segundo irmão espiritual de Teresa foi o Padre Adolfo Roulland (Adolphe) confiado à carmelita por Madre Maria de Gonzaga em 30 de maio de 1896. O jovem diácono, pouco tempo antes de sua ordenação presbiteral, quando estava terminando seus estudos no Instituto das Missões Exteriores de Paris, escreveu ao mosteiro de Lisieux pedindo que uma religiosa rezasse pelo seu ministério e, especialmente, pela missão que estava por assumir.

Na carta que escreveu ao mosteiro no dia 20 de junho de 1896, o jovem agradecia com essas palavras: “Fiquei muito contente porque me confiaram um anjo protetor na pessoa de Irmã Teresinha, que rezará pelo bom andamento da minha atividade apostólica”. Na mesma carta explicou que receberia a destinação da nossa missão no dia da sua ordenação presbiteral e disse que gostaria de celebrar para as carmelitas e dar a comunhão à Irmã Teresa.

Padre Roulland foi enviado para uma missão no sul da China e antes de partir, passou no Carmelo de Lisieux e teve a oportunidade de conversar com Teresa no parlatório, na mesma ocasião ela lhe entregou uma foto que se tornou uma de suas imagens mais conhecidas:

Logo depois foi a vez do Padre Roulland enviar uma foto sua junto com uma carta. Em sua resposta, Teresa escreveu dizendo estar muito contente por ter recebido da Madre a autorização especial para permanecer com a foto de seu irmão. Afinal, na época não era permitido que as monjas tivessem foto nem mesmo dos familiares. “Enquanto atravesso o mar contigo, você permanece aqui ao meu lado na nossa pobre cela”, escreve Teresa.

O sacerdote compartilhou com sua irmã carmelita momentos delicados e perigosos de sua missão. Teresa por sua vez, buscou sempre oferecer palavras de conforto e de comunhão, sentindo-se também parte da sua obra missionária. Quando a sua última carta chegou às mãos do Padre Roulland, Teresa já havia falecido. “Lá de cima continuarei trabalhando pela Igreja e pelas almas. Adeus meu irmão, reze por mim”, escrevia a religiosa em tom de despedida.

Em 1909, Padre Adolfo Roulland retornou à França e, durante a 1ª guerra mundial defendendo o seu país das tropas alemãs, testemunhou que muitos soldados e até mesmo generais, devotamente confiavam na intercessão da Irmã Teresa do Menino Jesus. Através dele sabemos também que muitos soldados portavam consigo no campo de batalha uma foto da carmelita com uma relíquia.

Padre Roulland contribuiu com depoimento durante o processo de beatificação em 1923 e estava presente na canonização de sua irmã Santa Teresa do Menino Jesus no dia 17 de maio de 1925. O sacerdote morreu no dia 12 de junho de 1934. Nas cartas endereçadas ao Padre Roulland, encontramos uma Teresa com um forte espírito missionário e também admirável senso de humor, se divertia ao contar fatos engraçados que pudessem levar um pouco de alegria ao seu irmão missionário.

As cartas de Santa Teresinha aos irmãos de coração nos revelam o seu amor pela missão da Igreja e o desejo ardente de anunciar Jesus Cristo em todas as partes do mundo. Não sem motivos o Papa Pio XI, no dia 14 de dezembro de 1927, a proclamou Padroeira Principal das Missões, juntamente com São Francisco Xavier, confiando à sua intercessão os missionários católicos no mundo inteiro.

 

Fragmentos das cartas de Santa Teresa do Menino Jesus:

Ao Padre Maurice Bellière:

“Penso ser útil dizer-vos, senhor seminarista, a grande parte que tomo na felicidade da Nossa Madre, Vossa carta de julho me afligiu muito, atribuindo à minha falta de fervor os combates que tivestes de travar, eu não cessava de implorar para vós o socorro maternal da doce Rainha dos Apóstolos”. Carta 198, 21 de outubro de 1896.
“Asseguro-vos, senhor seminarista, que faço tudo o que de mim depende a fim de obter para vós as graças que vos são necessárias; essas graças ser-vos-ão certamente concedidas, por Nosso Senhor nunca nos pede sacrifícios acima de nossas forças”. Carta 213, 26 de dezembro de 1896.
“Senhor seminarista… Se sentir consolo ao pensar que, no Carmelo, uma irmãzinha reza sem cessar por vós, minha gratidão não é menor que a vossa para com Nosso Senhor que me deu um irmãozinho que Ele destina a ser seu sacerdote e seu apóstolo”. Carta 220, 24 de fevereiro de 1897.
“A minha pena, ou melhor, meu coração, recusa-se a chamar-vos, de agora em diante, de “senhor seminarista” (senhor Padre), e nossa boa Madre me disse que podia fazer uso, quando vos escrevo, do nome que sempre utilizo quando falo de vós a Jesus”. Carta 224, 25 de abril de 1897.
“Meu querido irmãozinho, eu desejaria dizer-vos mil coisas que compreendo, agora que estou à porta da eternidade, mas não morro, entro na vida e tudo o que não vos posso dizer na terra, farei com que o compreendais do alto do Céu.” Carta 244, 9 de junho de 1897.
“Ó meu caro irmãozinho, suplico-vos, não penseis nunca que “me aborreceis ou me distraís” falando muito de vós. Seria possível que uma irmã deixasse de ter interesse por tudo o que toca seu irmão? Quanto a distrair-me, não tendes motivo algum de receio, pelo contrário, as vossas cartas unem-me ainda mais a Deus, fazendo-me contemplar de perto as maravilhas da sua misericórdia e do seu amor.” Carta 247, 21 de julho de 1897.
“Quando meu querido irmãozinho partir para África, segui-lo-ei, não pelo pensamento; pela oração minha alma estará sempre com ele e a sua fé saberá descobrir a presença de uma irmãzinha que Jesus lhe deu não para ser seu amparo durante apenas dois anos, mas até o último dia da sua vida”. Carta 253, 13 de julho de 1897.
“Meu pobre e querido irmãozinho. Vossa dor comove-me profundamente, mas vede como Jesus é bom. Permite que ainda possa escrever-vos a fim de consolar-vos e, sem dúvida, não é pela última vez. Esse doce Salvador ouve as vossas queixas e as vossas orações, é por isso que me deixa ainda na terra”. Carta 258, 18 de julho de 1897.
“Seria preciso conhecer-me apenas imperfeitamente para pensar que um relato detalhado das vossas faltas pudesse diminuir a ternura que tenho para com a vossa alma! Ó meu irmão, crede, não precisarei “pôr a mão na boca de Jesus”! Há muito tempo Ele se esqueceu das vossas infidelidades, só os vossos desejos de perfeição estão presentes para alegrar-Lhe o coração.” Carta 261, 26 de julho de 1897.
“Meu querido irmãozinho, Estou prontinha para partir, recebi meu passaporte para o céu… o médico espantado pelos progressos que a doença fizera em dois dias, disse à Nossa Madre que chegara o momento de atender os meus desejos fazendo-me receber a Unção dos enfermos. […] preciso falar-vos da herança que vos caberá depois da minha morte. Eis a parte que nossa Madre vos dará: 1º O relicário que recebi no dia da minha tomada de hábito e que, desde então, nunca mais me deixou. 2º Um pequeno crucifixo que me é incomparavelmente mais caro do que o grande, pois esse que tenho agora não é mais o primeiro que me foi dado. No Carmelo, trocam-se de vez em quando, os objetos de piedade, é um bom meio para impedir o apego.” Carta 263, 10 de agosto de 1897.
“Não posso temer um Deus que se fez por mim tão pequeno… amo-o!… pois é só amor e misericórdia! Ultima recordação de uma alma irmã da vossa” Carta 266, 25 de agosto de 1897.

Ao Padre Adolphe Roulland:

“Reverendo Padre, sinto-me indigna de estar especialmente associada a um dos missionários do nosso adorável Jesus, mas como a obediência confia-me esta doce tarefa, tenho certeza de que meu celeste Esposo suprirá os meus fracos méritos (nos quais não me apoio de forma alguma) e que Ele atenderá os desejos da minha alma fecundando o vosso apostolado.” Carta 189, 23 de julho de 1896.
“Meu irmão, permitis-me, não é, que não vos dê outro nome, pois Jesus dignou-se unir-nos pelos laços do apostolado. É-me muito agradável pensar que, desde toda a eternidade, Nosso Senhor formou esta união que deve salvar-lhe almas e que Ele me criou para ser a vossa irmã…” Carta 193, 30 de julho de 1896.
“Eu pensava que só encontraria no Céu o apóstolo, o irmão que eu pedira a Jesus, mas este Bem-amado Salvador, levantando um pouco o véu misterioso que oculta os segredos da eternidade, dignou-se dar-me, desde o exílio, a consolação de conhecer o irmão da minha alma, de trabalhar com ele para a salvação dos pobres infiéis”. Carta 201, 1º de novembro de 1896.
“Vossa carta impregnada de santa alegria, interessou-me muito, segui o vosso exemplo e ri à vontade às custas do vosso cozinheiro que vejo arrebentando a panela… vosso cartão de visita divertiu-me muito, nem sei de que lado virá-lo, estou como uma criança que quer ler um livro de cabeça para baixo.” Carta 19 de março de 1897.
“Meu irmão, recebi com alegria, ou melhor, com emoção, as relíquias que tivestes a bondade de me enviar. Vossa carta é quase uma carta de “adeus” para o Céu. Ao lê-la, parecia-me ouvir o relato das dificuldades dos vossos ancestrais no apostolado.” Carta 226, 9 de maio de 1897.
“Meu irmão, na vossa última carta (que me causou grande alegria), dissestes-me: “Sou um bebê que está aprendendo a falar”. Pois bem! Eu há cinco ou seis semanas, também sou um nenê, pois só vivo de leite, mas em breve irei sentar-me no banquete celeste, vou matar a sede nas águas da vida eterna”. Carta 254, 14 de julho de 1897.

Frei Juliano Luiz da Silva, O.Carm.

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